sábado, 24 de setembro de 2011

Sobre a Rádio e a Televisão
Discurso ao Congresso do 50º aniversário da Convenção Marconiana de Rádio, 3 de outubro 1947

Pelo grau de perfeição a que chegou, o rádio é uma obra‑prima do espírito inventivo do homem, uma maravilha da técnica, um prodígio da criação artística.
Possui ela o privilégio de ser como que desvencilhada e livre das condições de espaço e de tempo, que impediam ou retardavam todos os demais meios de comunicação entre os homens.
Com uma asa infinitamente mais veloz que o som, rápido como a luz, leva, em um instante, superando toda fronteira, as mensagens que lhe são confiadas. Ela as leva a todos e em toda parte, aos pequenos, como aos grandes, às casas perdidas sobre as montanhas, como às populosas cidades cosmopolitas, às solidões glaciais, onde a recebe o ouvido de um missionário ou de um explorador, como às massas dos mais densos aglomerados industriais.
Muito mais, a palavra, uma vez pronunciada, esta palavra em si fugaz, que sugere o ditado "verba volant", pode ser ouvida, à vontade, pode repetir‑se quantas vezes tivermos desejo ou necessidade dela.
Que vantagens incomparáveis, ela, se bem guiada e dirigida traz à ação prática e ao progresso intelectual, à atividade social e à vida religiosa! Através do rádio o homem de estado e os dirigentes de povos lançam suas idéias, seus programas, suas diretrizes; os doutos e os investigadores mantêm o mundo informado de suas descobertas; o artista e o educador cultivam e refinam os espíritos. Graças a ela as naves em perigo podem esperar socorro e salvação, ou ao menos, antes de submergir nas ondas, os náufragos podem fazer chegar aos seus caríssimos distantes o último adeus. E que multiplicidade de adaptações para dirigir‑se a todos! À criança e à mulher, ao empregado e ao homem de negócios, ao médico e ao agricultor; ela dedica horas especiais ao ensinamento, à técnica, à música; reserva o seu tempo para a oração comum. Não há voz, som ou palavra que não possa chegar mediante o rádio em todo ângulo da terra, ao ouvido dos ouvintes e penetrar em suas almas. Quando Davi, exaltando a muda eloqüência da natureza cantava: "In omnem terram exit sonus eorum et usque ad fines orbis eloquia eorum: Por toda a terra corre a sua voz, e até o extremo do mundo vai sua palavra". Deus, que falava pela boca do profeta, sabia em sua ciência e em sua sabedoria infinita que as forças físicas, escondidas por sua onipotência no seio dos elementos, e as leis misteriosas, que regem o complexo da atividade cósmica na harmonia daqueles mesmos elementos, seriam progressivamente descobertas e teriam sempre aplicações mais numerosas, úteis e fecundas.
Admiramos nisto a prodigiosa penetração da inteligência humana e sua engenhosidade. Mas sobretudo louvamos a soberana liberalidade do Criador, que tendo dotado sua criatura desta inteligência, dignou‑se fazer do homem seu colaborador.
O rádio pode ser um dos mais potentes meios para difundir a verdadeira civilização e cultura. Ele presta hoje serviços tornados quase indispensáveis à educação do sentimento de solidariedade entre os homens, à vida do estado e à do povo; ele pode exercer uma viva força de coesão nos povos e entre os povosEle pode dar diante de todo o mundo testemunho da verdade e glória a Deus, promover a vitória do Direito, trazer luzconsolação, esperança, reconciliação, amor ao mundo, avizinhar uns aos outros os homens e as nações. Ele pode fazer penetrar a voz de Cristo, a verdade do Evangelho, espírito do Evangelho, a caridade do Evangelho, até as extremidades da terra. A todos nós, e até a Nós próprio, Pai comum dos fiéis, proporciona­nos a alegria de ao mesmo tempo estar presente a todos os Nossos filhos do mundo inteiro, toda vez que dirigimos a eles as Nossas mensagens e lhes damos a Nossa bênção.
Tudo isto pode o rádio. Mas pode ainda, nas mãos dos homens cegos e perversos, colocar‑se à disposição do erro e da mentira, das vis paixões, da sensualidade, do orgulho, da cupidez, do ódio; pode transformar‑se naquele sepulcro aberto, cheio de maldição e de amargura, do qual fala S. Paulo, que engole as virtudes cristãs, a sã civilização e também a paz e a felicidade humana.
O rádio é semelhante ao fogo, que, para usar a bela imagem de Schiller em seu célebre "Lied von der Glocke", é uma força celeste nas mãos do homem que sabe contê‑lo e vigiá‑lo; mas se se desvencilha de suas cadeias, leva às cidades e aos campos devastações e ruínas.
Ao serviço da dignidade da vida e da moralidade cristã: faz que seja sagrada a inocência da criança, a pureza do adolescente, a santa castidade do matrimônio e a felicidade da vida de família fundada sobre o temor e sobre o amor de Deus.
Ao serviço da justiça: que sejam sagrados osintangíveis direitos da pessoa humana, não menos que o direito dos poderes públicos de exigirem dos indivíduos em particular e da comunidade ocumprimento das obrigações exigidas pelo bem comum; o direito dos povossobretudo dos mais débeis, à vida, como o direito da grande família das nações de pedir os sacrifícios necessários para a paz do mundo; o direito da Igreja de levar com plena liberdade a todos oshomens e a todas as gentes as riquezas da graça e da paz de Cristo.
A serviço do amor: É dever da hora presente. É preciso a todo custo abater o ódio altaneiro e profundo, do qual também o rádio se tornou, muitas vezes, agente e instrumento. Possa ele, por toda parte, fazer servir ao nobre ideal da caridade cristã a sua vasta e válida capacidade de ação!
Estes pensamentos devem sustentar na árdua empresa de reparação e de reconstrução.
Não queremos finalmente deixar sob silêncio a compreensão das verdadeiras necessidades da humanidade e de sua espiritualidade, da qual o rádio foi chamado a dar prova mediante as transmissões musicais. Nós não pretendemos aqui falar daquelas audições nas quais será dificílimo encontrar-se mérito artístico, virtude educativa e sobretudo correspondência com as dolorosas conjunturas do momento presente; mas referimo‑nos, antes, às execuções de música sagrada, como ao cuidado de tornar acessível ao público as composições mesmo profanas dos grandes mestres antigos e modernos, cujas obras‑primas difundem nos espíritos, nos corações, nas almas, as elevações sentimentais, da qual elas mesmas foram animadas.
Seria para se fazer, ao lado da história geral da música, também a de sua influência sobre a humanidade. Sem recorrer à mitologia, cujas fabulosas lendas de Orfeu e de Anfion apóiam‑se sobre um fundo de verdade, a Sagrada Escritura não mostra talvez a potência da música de Davi sobre a tétrica e feroz melancolia de Saul? Que lugar tinham os salmos nas cerimônias do Antigo Testamento! E quais têm eles na liturgia católica!

Discurso aos Locutores de Rádio, 22 de abril, 1948

A responsabilidade do criminoso, que faz do rádio um instrumento de corrupção intelectual ou moral, não cria apenas um problema: impõe um cunho de infâmia. A da indiferença, do apático, do cético; grave problema pelas conseqüências muitas vezes imperceptíveis, de si faz surgir outro problema: coloca‑nos diante da dificuldade, não propriamente um problema, o de fazer compreender que estão fazendo mal.
O problema nasce quando se trata de apresentar, com intenções retas e muitas vezes louváveis, alguns argumentos, acontecimentos, ou questões úteis e legitimamente interessantes do ponto de vista literário, artístico, psicológico, moral ou social. E eis então o que nos deixa perplexos: é preciso calar quando é oportuno e até necessário falar? Ou falar e correr o risco de alarmar alguns ouvidos, perturbar algumas almas, contaminar sobretudo o candor dos corações infantis? Os adultos deviam reprovar somente a si mesmos a própria curiosidade indiscreta ou imprudente; mas as crianças que, aturdidas, sem grave malícia, sobre este ponto iludem com tanta facilidade a vigilância dos progenitores!? É dever do locutor, na enunciação daquilo que deve dizer, fazer uso daquela delicadeza, daquela nobreza de linguagem que lhe permita ser compreendido pelos grandes, sem acordar a imaginação ou perturbar a simplicidade dos pequenos.

Discurso à Conferência Internacional de Radiodifusão, 5 de maio, 1950

Ouvem‑se muitas vezes deplorar as coisas torpes do rádio e o seu concurso na perversão dos espíritos e dos costumes. Mas por causa da malícia de alguns abusos dos dons de Deus e das descobertas do homem, dever‑se‑ia privar dos benefícios que constituem o fim providencial dos mesmos? Sem dúvida é preciso descobrir e condenar os abusos e, melhor ainda, tomar as providências mais eficazes para reprimi‑las. As conquistas, das quais toda geração se enriquece, é preciso pelo contrário valorizar, e fazer de modo que o bem delas derivante, graças à ação dos homens de ciência e de consciência, sobrepuje e neutralize o mal perpetrado por indignos especuladores.
Incalculável é este bem em todo o campo. Mesmo naquele essencialmente prático, quem poderá louvar suficientemente os imensos serviços prestados pelo rádio em urgentes necessidades e extremos perigos? Quem poderá dizer da utilidade social das informações nas recíprocas trocas de notícias entre todos os membros da grande família humana? Quem poderá valorizar a contribuição dada à cultura geral pela possibilidade de fazer ouvir as conferências e as lições mais variadas e fazer degustar os encantos sublimes da bela erudição, e da bela música?
A Igreja, dizíamos, interessa‑se por tudo isto. Há nisto algo de se estranhar? Ela está acima das diversidades nacionais, é universal. No rádio vê um elemento singularmente precioso para o cumprimento de sua própria missão. É verdade que escutar pelo rádio uma missa não é a mesma coisa que assistir pessoalmente ao divino sacrifício. O rádio não substitui completamente os contatos pessoais, mas que vantagem não traz ao Chefe Supremo da Cristandade e aos outros pastores de almas, consentindo‑lhes falar diretamente aos próprios filhos e filhas espirituais e orar com eles!
Que força íntima e que estímulo religioso pode trazer o microfone, que para muitos é muitas vezes o único conforto, o único sustentáculo que provém do exterior! Pensai em milhares de doentes imobilizados nos próprios leitos; as populações que não têm igreja nem sacerdote. Através do rádio eles podem pelo menos comunicar‑se ainda com as fontes da fé e da graça.
Justamente o rádio pode considerar‑se revestido de uma missão educadora, contanto que não descure, cumprindo‑a, aquilo que dela é o fim principal. Imagem de Deus, o homem tem o dever de aperfeiçoar esta divina semelhança no seu modo de pensar, de querer, de agir. Toda forma de educação deve tender a ajudá‑lo nisto. O corpo do homem, a sua vida temporal e material, muitas vezes recordamos, devem ser objeto de respeito e de cuidado. Mas a sua alma e a sua vida intelectual e espiritual são incomparavelmente mais dignas de solicitude: é, em realidade, a única e suprema razão de Toda instrução e de Toda educação. Como poderia, por isto, o rádio excluir da lista dos deveres e das finalidades que persegue, a formação religiosa?

Partes 1 da Encíclica "Miranda prorsus", 8 de setembro, 1957

Deveres do Radiouvinte
Portanto, o primeiro dever do radiouvinte é a apurada escolha dos programas. A transmissão radiofônica não deve ser um intruso, mas um amigo que entra no lar, mediante convite consciente e livre. Ai daquele que não sabe escolher os amigos que introduz no santuário da família! As transmissões admitidas em nossa casa “deverão ser apenas as portadoras da verdade e do bem, as que não desviam, antes ajudam os membros da família no cumprimento dos próprios deveres pessoais e sociais, e as que, se trata de jovens e crianças, longe de prejudicar, revigoram e prolongam a obra educativa dos pais e da escola”.
Os organismos católicos nacionais do rádio, dos quais já falamos, procurarão, com a ajuda da imprensa católica informar antecipadamente os fiéis acerca do valor das transmissões. Semelhantes indicações preventivas não serão porém, em Toda parte, possíveis, e muitas vezes terão apenas valor indicativo, porque a determinação de realizar certos programas não pode ser facilmente conhecida com antecipação.
Os pastores de almas lembrarão por isso aos fiéis que a lei de Deus proíbe ouvir transmissões prejudiciais para a sua fé ou para a sua vida moral, e exortarão os que têm cuidado da juventude à vigilância e à sapiente educação do sentido das responsabilidades, perante o uso do aparelho receptor admitido no lar.
Além disso, os bispos têm o dever de precaver os fiéis contra as estações emissoras que notoriamente propugnam princípios contrários à fé católica.
0 segundo dever do radiouvinte é o de dar a conhecer aos responsáveis dos programas os seus legítimos desejos e as justas objeções. Este dever decorre claramente da natureza mesma do rádio, que pode facilmente criar uma relação de sentido único, de quem transmite para quem escuta.
Os métodos modernos de sondagem da opinião pública ao permitirem medir o grau de interesse que suscitou cada uma das transmissões, são decerto grande auxílio para os responsáveis dos programas; mas o interesse, mais ou menos vivo despertado no público, pode ser multas vezes devido a causas transitórias ou a impulsos não racionais, e, portanto, não pode ser considerado índice seguro do reto critério de agir.
Os radiouvintes devem, portanto, colaborar na formação duma opinião pública esclarecida que permita exprimir, nas devidas formas, aprovações, encorajamentos e objeções, e contribuir para que o rádio, conforme a sua missão educativa, se ponha "ao serviço da verdade, da moralidade, da justiça e do amor".
Semelhante tarefa toca a todas as associações católicas que hão de procurar defender eficazmente os interesses dos fiéis neste campo. Nos países onde as circunstâncias o aconselhem, poderão, além disso, promover‑se associações especiais de radiouvintes e de espectadores, em coligação com os organismos nacionais.
Finalmente é dever dos radiouvintes apoiar as boas transmissões, e, acima de tudo, as que levam Deus até aos corações humanos. Hoje, quando, através das ondas do rádio, se agitam violentamente doutrinas errôneas, quando, com interferências propositadas e ruídos perturbadores, se cria no éter uma sonora "cortina de ferro", com o fim de não permitir que por este meio penetre a verdade que poderia sacudir e abalar a tirania do materialismo ateu, quando milhões de homens esperam ainda pela alvorada da boa nova ou por mais vasta instrução acerca da própria fé, quando os doentes ou os impossibilitados por qualquer outro motivo esperam ansiosamente unir-se às orações da comunidade cristã e ao sacrifício de Cristo, como poderiam os fiéis, mas sobretudo os que conhecem as vantagens do rádio por experiência cotidiana, não se mostrarem generosos em favorecer semelhantes programas?
Os programas religiosos
Sabemos quanto se tem feito e quanto se faz, nos vários países, para desenvolver programas católicos no rádio. São numerosos, graças a Deus, os eclesiásticos e leigos, que se tornaram pioneiros neste campo, assegurando para as transmissões sacras o lugar que corresponde ao primado dos valores religiosos sobre o resto das coisas humanas.
Considerando, no entanto, atentamente, as possibilidades que nos oferece o rádio para o apostolado, e impelidos pelo mandato do Divino Redentor "Indo por todo o mundo, pregai o Evangelho a toda a criatura", rogamos que se aumentem e aperfeiçoem ainda mais, segundo as necessidades e possibilidades de cada lugar, as transmissões religiosas.
E como, no rádio, a apresentação digna das funções sagradas, das verdades da fé e das informações acerca da vida da Igreja, requer, além da vigilância devida, talento e competências particulares, haverá que preparar, com especial cuidado, os sacerdotes e leigos destinados a esta importante atividade.
Para este fim, serão oportunamente promovidos, nos países em que os católicos disponham de meios modernos e de mais vasta experiência, cursos apropriados de adestramento que permitam aos candidatos, mesmo de outras nações, alcançar a competência profissional necessária para assegurar às emissões religiosas alto nível artístico e técnico.
Os organismos nacionais tomem providências no respeitante ao desenvolvimento e coordenação dos programas religiosos no próprio país, e colaborem, quanto possível, com os responsáveis das várias estações emissoras. Velando atentamente pela moralidade dos programas.
Quanto à participação, nas transmissões radiofônicas e televisoras, de eclesiásticos, mesmo que sejam religiosos isentos, os bispos poderão promulgar normas oportunas, confiando a sua execução aos organismos nacionais respectivos.
Emissoras católicas
Queremos dirigir especiais palavras de encorajamento e apoio às emissoras católicas de radiodifusão. Embora conhecendo as numerosas dificuldades que têm de enfrentar , confiamos que hão de prosseguir corajosamente, em colaboração recíproca, na sua apostólica ação, que Nós tanto apreciamos.
Os responsáveis pelos programas
Além disso, de bom grado dirigimos a todos os responsáveis pelos programas radiofônicos o Nosso agradecimento pela compreensão que muitos deles têm demonstrado, colocando de boa vontade à disposição da Palavra de Deus o tempo oportuno e os necessários meios técnicos. Agindo assim, participam nos méritos do apostolado, que se opera através das ondas das suas emissoras, segundo a promessa do Senhor: "Quem recebe ao profeta em nome do profeta, receberá o galardão do profeta".
Hoje, as emissões de qualidade exigem o emprego duma verdadeira arte. Por isso os diretores de programas, e todos os que tomam parte na preparação e execução dos mesmos, precisam de vasta cultura. A eles, pois, se dirige também a Nossa advertência, análoga à feita aos profissionais do cinema, a saber, que aproveitem amplamente as riquezas da cultura cristã.
Finalmente. Os bispos deverão recordar às autoridades estatais o dever que estas têm de garantir, nas formas devidas, a difusão das emissões religiosas, tendo em conta particularmente o caráter sagrado dos dias festivos , de preceito, e também as cotidianas necessidades espirituais dos fiéis.

Parte 2 da Encíclica "Miranda prorsus", 8 de setembro, 1957

Embora sem dispor da riqueza de elementos espetaculares e das vantagens das condições do ambiente, que proporciona o cinema, o rádio possui outras grandes possibilidades ainda não de todo exploradas.
Aperfeiçoado dia a dia por novos progressos, o rádio presta inestimáveis serviços nos variados campos da técnica, permitindo até dirigir à distância, para objetivos pré‑estabelecidos, engenhos sem piloto. Nós, contudo, consideramos que o mais nobre serviço a que ele é chamado é o de ilustrar e educar o homem, dirigindo‑lhe a mente e o coração para esferas do espírito cada vez mais altas.
Poder ouvir homens e seguir acontecimentos longínquos sem sair das paredes domésticas, e assistir à distância às mais variadas manifestações da vida social e cultural, corresponde a profundo anseio humano.
Não é, pois, de maravilhar que tantas casas se tenham munido rapidamente de aparelhos radiofônicos, que permitem abrir misteriosa janela sobre o vasto mundo, do qual chegam dia e noite ecos da vida trepidante das várias culturas, línguas e nações, sob forma de inumeráveis programas, ricos de notícias, de entrevistas, de conferências, de comunicações, de atualidade e de arte, de transmissões de canto e música.
É coisa ótima que os fiéis aproveitem deste privilégio do nosso século, e gozem das riquezas da instrução, do divertimento, da arte e da própria palavra de Deus que o rádio pode trazer, para dilatar as suas consciências e os seus corações.
Todos sabem quão grande virtude educativa podem ter as boas transmissões; mas ao mesmo tempo, o uso do rádio importa em responsabilidades, porque também ele, como as outras técnicas, pode ser empregado para o bem e para o mal. Pode‑se aplicar ao rádio a palavra da Escritura: "Nela bendizemos a Deus e o Pai: e nela amaldiçoamos os homens, que foram feitos à imagem de Deus. Da mesma boca procede à bênção e a maldição".

Carta Apostólica, 1 de janeiro, 1954

Os rápidos progressos aos quais se endereça, já, em muitos países, a televisão, mantêm sempre mais ágil a Nossa atenção sobre este maravilhoso meio oferecido pela ciência e pela técnica à humanidade, precioso e perigoso a um mesmo tempo, pelos profundos reflexos que ele está destinado a exercer sobre a vida pública e privada das nações.
Reconhecemos plenamente o valor desta luminosa conquista da ciência, sendo uma nova manifestação das admiráveis grandezas de Deus, o qual "deu aos homens a ciência com o escopo de ser honrado em suas maravilhas". Também a televisão, portanto, impõe a nós todos o dever de reconhecimento, que a Igreja não se cansa jamais de recordar aos seus filhos todo dia, no santo sacrifício do altar, quando os adverte que: "é coisa verdadeiramente digna e justa, reta e salutar agradecer sempre e em toda parte", a Deus pelos seus dons. De resto, não é difícil perceber as inumeráveis vantagens da televisão, quando ela for colocada a serviço do homem, para sua perfeição.
Enquanto, nestes últimos tempos, o cinema, o esporte, e as duras necessidades de trabalho cotidiano tendem a afastar sempre mais da casa os membros da família, perturbando de tal modo o natural desenvolvimento da vida doméstica, como não nos alegrar em ver a televisão contribuir eficazmente para reconstruir este equilíbrio, oferecendo à família inteira possibilidade de tomar, reunida, honesto descanso, longe dos perigos das companhias e lugares malsãos?
Nem podemos permanecer indiferentes diante da benéfica influência que a televisão está apta a exercitar sob o aspecto social, em relação à cultura, à educação popular, ao ensinamento escolástico e à própria vida dos povos, os quais, mediante este instrumento, serão certamente ajudados a melhor conhecer‑se e compreender‑se, e a elevar‑se à união cordial e a uma maior colaboração recíproca.
Tais considerações não devem, entretanto, fazer esquecer outro aspecto deste delicado e importante argumento. Se, realmente a televisão bem regulada pode constituir um meio eficaz de sábia e cristã educação, é além disto verdade que a mesma não está dissociada de perigos, pelos abusos e pelas profanações a que poderia ser conduzida pela debilidade e pela malícia humana; tais perigos são tanto mais graves quanto maior é a potência sugestiva deste instrumento e quanto mais vasto e indiscriminado é o público ao qual se dirige. Diferente do teatro e do cinema, que limitam os seus espetáculos a quantos aí vão por espontânea escolha, a televisão dirige‑se sobretudo a grupos familiares, compostos de pessoas de toda idade e sexo, de cultura e preparação moral diferentes, e leva o jornal, a notícia variada, o espetáculo. Como o rádio, ela pode entrar em toda casa e lugar, a qualquer hora, levando não somente os sons e palavras, mas também a concretização, a mobilidade das imagens; o que lhe confere maior capacidade emotiva, sobretudo para os jovens.
Adicione‑se a isto que os programas das transmissões televisoras são formados em grande parte pelas películas cinematográficas e representações teatrais, que, como a experiência ensina, em número não ainda limitado, não estão capacitadas a satisfazer plenamente as exigências da moral natural e cristã. Deve‑se relevar, finalmente, que a televisão encontra o seu público mais ávido e mais atento entre as crianças e os adolescentes, que, em virtude da idade, são os mais sujeitos ao fascínio da mesma, e também, em transformar, consciente ou inconscientemente, em realidade vivente as imagens absorvidas pela visão animada da tela.
É necessário compreender como a televisão interessa proximamente, mais que nunca, à educação dos jovens e à própria salvação do lar.
Ora, quando se pensa no inestimável valor da família, que é a célula da sociedade, e se reflete que entre as paredes domésticas deve iniciar‑se e desenvolver‑se o progresso não só corporal, mas também espiritual da criança, esperança preciosa da Igreja e da Pátria, não podemos senão proclamar, a todos aqueles que compartilham das responsabilidades da televisão, que gravíssimos são os deveres e as responsabilidades que lhes incumbe diante de Deus, e da sociedade. As autoridades públicas, sobretudo, cabe tomar toda cautela, afim de que de modo algum seja ofendida ou perturbada aquela aura de pureza e de reserva que deve circundar o lar.
Diante de nossa mente não cessa de estar presente o quadro doloroso da potência maléfica e subversiva dos espetáculos cinematográficos. Mas como não se horrorizar com o pensamento que, mediante a televisão, pode‑se introduzir entre as próprias paredes domésticas aquela atmosfera que envenena de materialismo, de fatuidade de hedonismo, respirada freqüentemente em muitas salas cinematográficas? Verdadeiramente não se poderia imaginar coisa mais fatal para as forças espirituais da nação, se diante de tantas almas inocentes, no seio da própria família, devessem repetir‑se àquelas impressionantes revelações do prazer, das paixões e do mal que podem sacudir e fazer arruinar para sempre toda uma construção de pureza, de bondade e de sã educação individual e social,
Por estes motivos, Nós acreditamos oportuno observar que a normal vigilância que cumpre à autoridade responsável pelos espetáculos públicos não é suficiente para as transmissões televisoras; a fim de conseguir um serviço eficaz sob o ponto de vista moral, é necessário um critério diverso de valorização, tratando‑se de representações que devem penetrar no santuário da família. Salienta‑se, portanto, sobretudo neste campo, como são infundados os Pretendidos direitos da indiscriminada liberdade da arte, ou do recurso ao pretexto da liberdade de informação e de pensamento, estando em jogo superiores valores a serem protegidos, cujos violadores não poderiam fugir à severa sanção anunciada pelo Divino Salvador: "Ai do mundo pelos escândalos!... Ai do homem por cuja culpa vem o escândalo!"
Nós nutrimos profunda confiança em que o alto sentido de responsabilidade daqueles que presidem à vida pública virá impedir as tristes ocorrências que acima mencionamos.
Preferimos esperar que, por quanto diz respeito aos programas dos espetáculos, oportunas normas serão emanadas, com o fim de fazer que a televisão sirva para uma sadia distração dos homens, e contribua eficazmente, em todas as circunstâncias, para a educação e elevação moral dos cidadãos. E para que tais providências sejam plenamente aplicadas, exige‑se da parte de todos operosa e atenta vigilância. E para que tal escopo seja atingido, avalia‑se quanto é necessário que os programas televisores sejam bem preparados.
Igualmente, é mais que nunca necessário e urgente formar fiéis com uma consciência reta dos deveres cristãos acerca do uso da televisão: uma consciência que saiba perceber eventuais perigos, e se aferre aos juízos da autoridade eclesiástica sobre a moralidade das representações teletransmitidas.
Sejam iluminados em primeiro lugar os progenitores e os educadores, a fim de que não tenham de chorar, quando não for mais possível remediar, chorar sobre ruínas espirituais de inocências perdidas.

Parte 3 da Encíclica "Miranda prorsus", 8 de setembro, 1957

Os programas religiosos
Temos conhecimento do interesse com que um vasto público segue as transmissões católicas na televisão. É óbvio que a assistência à santa missa pela televisão ‑ como há alguns anos dissemos ‑ não é a mesma coisa que a assistência física ao sacrifício divino requerida para cumprir o preceito dos dias festivos. Todavia, os frutos copiosos que, para o incremento da fé e santificação das almas, provêm das transmissões televisoras das cerimônias litúrgicas, para aqueles que não podem, com presença normal, assistir a elas, induzem-nos a encorajar estas transmissões.
Será da competência dos bispos de cada país julgar da oportunidade das várias transmissões religiosas, e confiar a sua execução ao competente organismo nacional, que, como nos precedentes setores, desenvolverá conveniente atividade informativa, educativa, de coordenação e de vigilância sobre a moralidade dos programas.
Problemas específicos da televisão
A televisão, além dos aspectos comuns com as duas precedentes técnicas de difusão, possui também características próprias. Permite, com efeito, assistir, de forma simultaneamente auditiva e visual, a acontecimentos ocorridos, à distância e no próprio instante em que acontecem, com aquela sugestibilidade que se aproxima do contato pessoal e cuja feição e forma imediata é aumentada pela sensação de intimidade e confiança própria da vida familiar.
Na maior consideração se deve ter, portanto, este caráter de sugestibilidade das transmissões televisoras na intimidade do santuário da família, onde será incalculável sua influência na formação da vida espiritual, intelectual e moral dos membros da mesma, e, sobretudo, dos filhos, que hão de ser dominados, inevitavelmente, pela fascinação da nova técnica.
Com a grande vantagem de entreter mais facilmente, dentro das paredes domésticas, grandes e pequenos, a televisão pode contribuir para reforçar os liames do amor e da fidelidade na família, mas sempre com a condição de não vir a prejudicar as mesmas virtudes da fidelidade, da pureza e do amor.
Não falta, todavia, quem julgue impossível, ao menos na hora presente. A satisfação de tão nobres exigências. O compromisso tomado com os espectadores ‑ dizem eles ‑ requer que se preencha, seja como for o tempo estabelecido para as transmissões. A necessidade de ter à disposição uma seleção vasta de programas obriga a recorrer também àqueles espetáculos que , de início, eram destinados às salas públicas. A televisão, finalmente, não é só para jovens, mas também para adultos.
As dificuldades são reais, mas a solução delas não pode ser adiada para período ulterior, quando a falta de discrição e de prudência no uso da televisão já tiver causado gravíssimos danos individuais e sociais ‑ hoje, talvez, ainda dificilmente avaliáveis.
Para que essa solução se possa obter ao mesmo tempo em que se vai introduzindo em cada país a televisão, será preciso, primeiro que tudo, levar a cabo esforço intenso na preparação de programas que correspondam às exigências morais, psicológicas e técnicas. Convidamos, por isso, os homens católicos de cultura, ciência e arte, e, em primeiro lugar, o clero e as ordens e congregações religiosas, a procurar dominar a nova técnica e prestar a sua colaboração a fim de que a televisão possa aproveitar as riquezas espirituais do passado e as de todo o autêntico progresso.
Será, além disso, preciso que os responsáveis pelos programas, não só respeitem os princípios religiosos e morais, mas tenham em conta o perigo que transmissões destinadas a adultos podem oferecer aos jovens. Noutros campos, como por exemplo sucede no cinema e no teatro, os jovens, na maioria dos países civilizados, estão protegidos com especiais medidas preventivas contra os espetáculos inconvenientes. Logicamente, e com maior razão, devem também ser asseguradas às vantagens de uma apurada vigilância no respeitante à televisão.
Quando não se excluam das transmissões, como aliás tem sido louvavelmente feito nalguns lugares, espetáculos vedados a menores, serão pelo menos indispensáveis medidas preventivas de precaução.
Todavia, nem mesmo a boa vontade e a conscienciosa atividade profissional de quem transmite são suficientes para assegurar o pleno proveito da maravilhosa técnica da pequena tela dum aparelho televisor, nem suficientes também para afastar todo o perigo. A vigilância prudente e avisada de quem recebe em sua casa a transmissão é insubstituível. A moderação no uso da televisão, a admissão prudente dos filhos a presenciar programas adequados a sua idade, a formação do Caráter e do reto juízo acerca dos espetáculos vistos, e, finalmente, o afastá‑los dos programas inconvenientes, incumbem, como grave dever de consciência, aos pais e aos educadores. Bem sabemos que, especialmente este último ponto, poderá criar situações delicadas e difíceis, e o sentido pedagógico muitas vezes exigirá dos pais darem bom exemplo também com o sacrifício pessoal em renunciar a determinados programas. Mas seria porventura demasiado pedir aos pais um sacrifício, quando está em jogo o bem supremo dos filhos?
Será, portanto, "mais que necessário e urgente ‑ como escrevemos aos bispos da Itália ‑ formar nos fiéis uma consciência reta dos deveres cristãos acerca do uso da televisão", para que esta não sirva nunca para difundir o erro e o mal, mas se torne "instrumento de informação, de formação e de transformação".

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